Com 20 milhões de habitantes e segundo maior
colégio eleitoral do país, Minas Gerais é o estado com o maior número
de presidentes da República desde o primeiro governo republicano, em 1889. A vitória de Dilma
Rousseff, que é mineira, contribui para ampliar a diferença entre Minas e as demais
unidades da federação. Tradicionalmente com fama de quietos, oito chefes de
Estado mineiros ficaram mais de 20 anos no poder. Rio Grande do Sul e Rio de
Janeiro conseguiram nomear sete presidentes, cada um. Por outro lado, 14
estados brasileiros nunca elegeram uma autoridade máxima de nação.
Se vencesse, o candidato José Serra poderia ter se tornado o
sexto presidente paulista do período republicano, colocando o estado de São Paulo mais
próximo dos gaúchos e fluminenses, primeiros colocados no ranking
presidenciável, após Minas Gerais.
Em contrapartida, os sete estados que integram a região
Norte ainda não conseguiram enviar sequer um representante à Presidência da
República. O Centro-oeste, por sua vez, contabiliza apenas dois, o que reflete
o ditado “uns com tanto, outros com tão pouco”. Já a região Sudeste elegeu 20
presidentes, enquanto no Nordeste foram 10. O Sul foi responsável por nove.
A partir da primeira presidência do período republicano,
assumida pelo marechal Deodoro da Fonseca, o Estado brasileiro teve 41 presidentes registrados
na galeria da Presidência da República, alguns com mais de um mandato.
Apesar de Minas Gerais responder pelo maior número de
presidentes que assumiram o cargo, o
estado do Rio Grande do Sul contabiliza, por meio de seus
presidentes, mais de 37 anos no poder. O Rio de Janeiro acumula cerca de 21
anos. Portanto, tempo superior a dos mineiros. São Paulo, por sua vez,
permaneceu aproximadamente 12 anos na Presidência da República.
Mineiro é centralizador e ponderado
O professor do departamento de história da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG) Eduardo Paiva acredita que fatores pontuais
históricos e culturais contribuíram para o significativo número de mineiros que
chegaram ao mais alto posto do país. “O mito em torno do político mineiro é de
que ele é centralizador e ponderado. A sabedoria da política mineira é muito
antiga, construída pelo menos desde o final do século XVIII”, diz.
Eduardo Paiva cita Tancredo Neves, que apesar de eleito não
chegou a tomar posse, como representante da figura do político mineiro. “Em um
momento muito particular da história republicana recente foi evocado a figura
do político mineiro e as atenções se voltaram para Tancredo Neves. No contexto
de crise, inclusive institucional, se constrói um consenso político em torno de Minas. E ,
então, aparece um personagem mineiro. Mais do que de Minas, é o mineiro. Porque
se evoca uma construção antiga do político mineiro”, analisa.
Por outro lado, o historiador acredita que é preciso particularizar
os casos, porque alguns dos presidentes são frutos de acordo entre Minas Gerais
e São Paulo na chamada República Velha. “Foram eleitos em momentos históricos
muito particulares, nos quais Minas tinha importante peso político, demográfico
e econômico. Isso acabou determinando o jogo de forças políticas. Neste
contexto, apareceram candidatos e eles foram votados”, avalia.
Na República Velha, Minas e São Paulo fizeram um acordo
político de revezamento do poder nacional, entre 1889 e 1930, período em que se
destacava a oligarquia cafeeira. São Paulo era o centro da economia cafeeira e
Minas, além de ser o segundo maior produtor de café, detinha o maior
contingente eleitoral no país. O acordo ficou conhecido como a “política do
café com leite” e previa um rodízio na indicação do candidato a ser apoiado
pelos dois estados mais poderosos nas eleições.
Apesar da preponderância de Minas no passado, Eduardo Paiva
lembra que há algumas décadas o
estado não conseguiu eleger presidentes. “Nas últimas décadas
não existem nomes grandes na política mineira. O último grande personagem
político de Minas, que foi eleito e assumiu, foi Juscelino Kubitschek”,
destaca. Itamar Franco, apesar de ter sido presidente da República, assumiu a
presidência após o impeachment de Fernando Collor de Mello e Tancredo Neves não
chegou a assumir o mandato.
Além de tranquilo e ponderado, o historiador destaca que a
figura do político mineiro transformou-se a partir de Juscelino Kubitschek.
“Nessa campanha, muitos candidatos a governador evocaram a memória de Juscelino
como um homem moderno e empreendedor que garante o futuro do Estado. Evoca-se,
então, o político mineiro, não mais o antigo, mas o empreendedor que, ao mesmo
tempo, consegue ser ponderado e tranquilo”, constata.
Conciliadores
Para o cientista político Octaciano Nogueira, a
circunstância de Minas ter sagrado-se com o maior número de presidentes, depois
da proclamação da República, deve-se às características dominantes dos
políticos mineiros. “São conhecidos, primeiro por sua temperança. Segundo, pela
habilidade que facilita as negociações. Terceiro, pela busca constante do
entendimento que evita os confrontos e facilita as soluções. Essas habilidades
e características vêm de longe. Foram constantes durante o Império e frequentes
na República”, avalia.
Octaciano enumera qualidades dos políticos mineiros que
podem contribuir para a vocação para a política. “A discrição com que se
comportam, sem arroubos e rompantes, fazem parte do perfil de quase todos.
Sabem ser reservados e guardar conveniências. Ao contrário dos nordestinos,
quase sempre exaltados, francos, diretos e sinceros, os mineiros são sóbrios,
daí sua habilidade para um recurso indispensável na política: os entendimentos,
os acordos e a conciliação em que são especialistas. Há quem suponha que se
tornaram especialistas, depois que Tiradentes, por sua loquacidade, terminou
enforcado”, conta.
Galeria mineira
Em 1906, Affonso Penna, que estabeleceu a obrigatoriedade do
serviço militar, foi o primeiro representante mineiro. Depois, chegou ao poder,
em 1914, o advogado Wenceslau Braz, que debelou a Gu erra
do Contestado (1912-1916) entre os estados do Paraná e Santa Catarina, que
disputavam território.
Delfim Moreira, foi o vice na chapa vitoriosa que elegeu Rodrigues
Alves presidente
ao governo em 1918. E assumiu o mandato quando Rodrigues Alves faleceu, vítima
da gripe espanhola, até que fossem convocadas novas eleições em 1919.
O quarto nome mineiro é o de Arthur Bernardes, que assumiu o
governo em 1922, em pleno estado de sítio. Durante sua gestão, sofreu
constantes ameaças por conspirações civis e militares e valeu-se de poderes
excepcionais para neutralizar os opositores.
Na sequência, Carlos Luz, enquanto presidente da Câmara dos
Deputados, ocupou a presidência apenas por três dias, substituindo o licenciado
Café Filho para tratamento de saúde. Carlos Luz, o presidente que menos tempo
permaneceu no cargo, foi deposto no dia 11 de novembro pelo golpe militar
liderado pelo então ministro da Gu erra,
general Lott.
Juscelino Kubitschek, responsável pela construção da capital
federal em Brasília, foi eleito com mais de três milhões de votos para governar
de 1956 a
1961. Com um estilo inovador, durante todo o seu mandato o Brasil viveu um
período de notável desenvolvimento econômico e relativa estabilidade política.
Tancredo Neves, bastante atuante no movimento das Diretas
Já, foi o representante dos partidos de oposição reunidos na Aliança
Democrática e eleito 1985, pelo voto indireto do colégio eleitoral. Contudo, na
véspera de tomar posse, Tancredo foi internado em estado grave no hospital e
morreu pouco tempo depois, fato que provocou grande comoção pública.
Para completar a galeria dos presidentes mineiros, aparece
Itamar Franco que, por ser vice, governou de 1992 a 1995, após o
impeachment de Fernando Collor de Mello. A administração de Itamar foi marcada
pelo lançamento do Plano Real, em 1994, estabelecido pelo então ministro da
Fazenda, Fernando Henrique Cardoso.
Com a vitória de Dilma Rousseff, os mineiros herdam um novo
título: a primeira mulher eleita presidente do Brasil é mineira. Uma prova de
que, além da especialidade na fabricação de pães de queijo, os mineiros são
bons mesmos em produzir presidentes.
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