“Vamos comunicar com a bandidagem de outras alas. Temos que ser unidos. Esses vermes estão demais no bagulho (sic)”. A mensagem integra uma carta supostamente escrita por presos do complexo prisional de São Joaquim de Bicas, na região metropolitana de Belo Horizonte, a que a reportagem de O TEMPO teve acesso. No texto, os detentos criticam a atuação dos agentes penitenciários, o que chegou ao conhecimento do serviço de segurança do sistema na semana passada e deixou profissionais em alerta. Dois ou três dias após a circulação do texto, um funcionário da unidade Bicas 1 foi alvo de atentado quando voltava do serviço para casa, na noite de anteontem, no Barreiro, na capital.
Renato Damasceno, 38, estava uniformizado quando percebeu a aproximação de um carro vermelho, ocupado por dois homens. O veículo parou ao lado da motocicleta conduzida por ele, e a dupla fez disparos, que atingiram a vítima duas vezes nas costas. O agente só não morreu, segundo colegas, porque também estava armado e revidou. Além de atirar várias vezes contra Damasceno, os bandidos também dispararam contra o tanque de combustível da moto e fugiram sem roubar nada.
O Sindicato dos Agentes Penitenciários do Estado de Minas Gerais relaciona o crime à carta que circulou na última semana e pede investigação rigorosa do caso. “Entre quinta-feira e sexta-feira, agentes interceptaram uma carta com ameaças na área de inteligência. Quando é domingo, um agente daquela região sofre uma tentativa de assassinato? É muito suspeito. Todos os agentes estão em alerta máximo”, afirma o presidente da entidade, Adeilton de Souza Rocha.
A Polícia Civil informou apenas que o inquérito está em andamento e que não divulgaria mais detalhes, para não atrapalhar as investigações. A Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) declarou que não recebeu “registros formais” de reclamações ou ameaças feitas por presos. Na suposta carta, presos da unidade Bicas 2 criticam a atuação dos agentes, que estariam proibindo as visitas íntimas realizadas irregularmente em barracas improvisadas com lençóis e cobertores no pátio do local.
Crime. Renato Damasceno, que é contratado na unidade Bicas 1 desde 2006, tinha trabalhado das 7h às 19h no anteontem. Ele estava no bairro Santa Maria, no Barreiro, quando foi surpreendido pela dupla armada. Não houve, segundo relatos à polícia, anúncio de assalto. Diante da reação de Damasceno, que também começou a atirar, a dupla fugiu. Ninguém tinha sido preso até a noite de ontem.
O presidente do sindicato contou que o próprio agente, em conversa com diretores da entidade, disse acreditar ter sido vítima de um atentado. Rocha relaciona a tensão dentro do sistema à superlotação do presídio – as unidades 1 e 2 de Bicas estão com mais do dobro de presos acima da capacidade. “Quando há muitos detentos e muitas visitas, os presos começam a burlar as regras”, afirmou.
Na carta supostamente escrita pelos presos, eles combinam de fazer greve de fome e recusar a sair para o banho de sol até conseguir conversar com o diretor do presídio sobre a suspensão das visitas íntimas. “Tenho certeza de que todos os vagabundos que representa na rua não vão deixar isso acontecer (sic)”, diz o texto.
Recuperação
Saúde. Segundo o sindicato dos agentes, Renato Damasceno permanece internado e terá que passar por cirurgia para retirada das balas. O local em que ele está hospitalizado é mantido em sigilo.
Saiba mais
Lotação. Com 820 vagas, a unidade 1 do presídio de São Joaquim de Bicas tem 2.000 presos ocupando. No Bicas 2, a situação se repete. São 1.700 detentos para 754 vagas, 946 a mais.
Conflito. A relação entre detentos e agentes nas unidades de São Joaquim de Bicas é tensa. No fim de 2014, reportagem de O TEMPO relatou situações de humilhação enfrentada por familiares de presos.
Fechado. Na semana passada, O TEMPO mostrou que, superlotado, o sistema prisional mineiro estaria prestes a fechar as portas, segundo servidor ligado à chefia da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds). De acordo com ele, a ordem para não prender mais criminosos por não ter onde os colocar chegou a ser dada em 2014, mas a proximidade das eleições fez com que a determinação fosse abandonada.
Limite. Desde então, com ainda mais presos, a situação no sistema teria ficado pior. O Centro de Remanejamento do Sistema Prisional (Ceresp) da Gameleira, na capital, é um exemplo.
Interdição. Há cerca de dois anos, acordo judicial limitou a lotação ao dobro da capacidade da unidade, que tem 404 vagas, mas em 2015 chegou a abrigar 1.500 presos. O local foi interditado no último dia 10.
FONTE: OTEMPO
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